Querem criminalizar o funk, isso pode?
A criminalização da cultura
Tramita na Comissão de
Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal (CDH) a Sugestão
nº. 17/2017 sob relatoria do Senador Romário, que busca levar à discussão, a
criminalização do funk, a proposta
que surgiu de uma ideia legislativa contou com mais de 20.000 apoios na
página e-cidadania. Busca referida proposta, enquadrar o estilo musical e
os eventos que o promovem como um crime de saúde pública, conforme justificou o
autor da sugestão:
Disponível em: https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaoideia?id=65513
O criador da sugestão legislativa,
também é editor da página do facebook
“funk é um lixo”, que atualmente conta
com 168.527 curtidas.
Pois bem, opinião não é crime e assim não se deve condenar tanto quem critica como quem promove o funk, qualquer ato que buscar silenciá-los
remonta um Brasil de décadas passadas, controlado pelo fascismo ditatorial e é justamente em
superação deste período de grave violação da liberdade e da dignidade humana,
que em outubro de 1988 com a promulgação da Constituição Federal, foram
assegurando como direitos fundamentais o direito a liberdade artística (Art. 5, inc. IX) e do pensamento (Art. 5, inc.IV). Portanto, este debate reflete o conflito de dois direitos
fundamentais assegurado a qualquer cidadão e como nenhum direito se faz absoluto, mas, são por natureza relativos
é preciso analisar com cautela os dois lados da moeda.
Dadas as considerações, é no mínimo equivocada a ideia de que o funk
possa ser responsável pelo problemas sociais que a sociedade brasileira
enfrenta, vincular este movimento musical ao vetor responsável pela promoção
da criminalidade implica em deixar de analisar a inação do Estado em empenhar atividades voltadas a promoção
da população, sobretudo, da periferia e também de sua responsabilidade na efetivação das políticas publicas voltadas a atender as demandas de segurança pública do Estado Brasileiro.
O fundamento para o apoio da sugestão legislativa reside justamente no estereótipo criado acerca da cultura da periferia e este preconceito não é novidade décadas antes o rap enfrentou assim como cem anos antes o samba. Movimentos musicais estes que surgiram a partir da vivência das camadas mais pobres da população brasileira.
A cultura de um povo é formada pelo conjunto de vivência que experimenta todos os seus cidadãos. Esta formação cultural não é analisada de maneira singular a partir do que uma pequena parcela da população considera relevante. O termo cultura aduz ao complexo de relações sociais de um povo e neste conjunto o funk está incluído.
Como expressão cultural que é, o funk é a voz da comunidade e não seu limbo. Como música representa as experiências de quem o propaga e de quem o ouve se faz refúgio de alegria. As letras de funk repudiadas, devem ser no mínimo analisadas sob dois aspectos 1) a aversão aos modos de vida ou ambições do funkeiro, representa a falta de oportunidade dispostas a este ou 2) o retrato descaso social que vive as camadas mais pobres da população.
Reprodução: Google
O problema do estereótipo reside na generalização de um tema, uma
análise rápida na página “funk é lixo” depreende que no mínimo qualquer vídeo
considerado de conteúdo negativo pelos seguidores será tratado como um vídeo de
funk, mas, pude identificar vídeos que ao fundo tocavam axé, forró, pop estilos musicais
diversos.
Os crimes de saúde pública são identificados nas condutas definidas pelo legislador como prejudiciais a saúde da coletividade, conforme escreve em seu livro o Professor Fernando Capez “Todos têm, individualmente,direito ao ar, à água etc., obviamente saudáveis; sempre que esse direito for individualmente violado, teremos um crime de perigo ou de dano individual” como é o caso do crime de epidemia (art. 267) omissão de notificação de doença (art. 269) perceba que um movimento musical não guarda relação com estes crimes. Na tentativa de criar um novo enquadramento penal, busca os defensores desta medida criar estereótipos aos bailes funks e aos próprios cantores do gênero.
Partindo para o final, conforme já fora dito a cultura
retrata uma realidade vivida, na música o jovem canta seus medos, sonhos,
aspirações e desejos, é a forma pelo qual é
denunciado ao mundo exterior todo o complexo de vida experimentado pelo
artista.
Efetivamente, surgindo desta ideia legislativa um projeto de lei será no mínimo inconstitucional dada as latentes violações ao direito a liberdade artística e a manifestação cultural do cidadão.
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